A palma forrageira salvou a pecuária leiteira do Nordeste

O Semiárido tem testemunhado uma série positiva de cinco anos de chuvas, acima da média anual, na maior parte de seu território. Apesar do período auspicioso espera-se que a região não tenha que se defrontar em breve com um ciclo seco. Que esta série de anos com boas chuvas perdure por um longo período.
Recordar é necessário. Neste caso sendo, bom lembrar que a tecnologia líder que garantiu a manutenção e o crescimento da produção de leite no Nordeste desde o ano de 2012 foi o repovoamento e ampliação das áreas cultivadas com palma forrageira.
A cultivar Orelha de elefante mexicana, identificada pelo programa de pesquisa do IPA em associação com algumas instituições do Nordeste tem se constituído na mais importante opção de cultivo nas novas áreas perfazendo uma fração superior a 80% das novas áreas de plantio.

Foram várias as iniciativas estaduais em distribuir raquetes da cultivar resistente à cochonilha do carmim, que resultaram na reconstituição da área original da palma, cultivar Gigante, destacando-se os esforços dos governos estaduais de Pernambuco, Bahia, Sergipe, Paraíba e Ceará.
A importância das instituições e o comprometimento do produtor
Este é um exemplo clássico de como uma iniciativa pode ser bem-sucedida em assegurar o fortalecimento de uma atividade econômica, neste caso a pecuária bovina, caprina e ovina, que representam as cadeias produtivas mais destacadas no semiárido dependente de precipitações anuais.

Avalia-se que caso as raquetes ou cladódios que foram distribuídas houvessem sido devidamente plantadas, a área de palma forrageira no Nordeste seria atualmente em torno de um milhão de hectares, quando as estimativas apontam para uma área cultivada que varia entre 500 e 600 mil hectares.
Preze-se os esforços de instituições como as organizações estaduais de pesquisa e extensão rural, as secretarias municipais de agricultura, as associações, sindicatos e cooperativas de produtores, o suporte financeiro do governo federal em ao menos dois grandes programas, financiados via MCTI e MDA, o comprometimento de grupos de pesquisa e ensino de várias instituições de ensino superior e, mais do que tudo ressalte-se o programa de melhoramento genético de palma forrageira que vem sendo conduzido no estado de Pernambuco há mais de cinquenta anos sem o qual não se contaria com a cultivar Orelha de elefante mexicana ou os novos materiais em via de registro e liberação.

Que opções restam ao semiárido?
Falou-se dos cactos, fundamentalmente das espécies de palma forrageira, entretanto não se pode deixar de citar as demais opções com espécies gramíneas, da família Poacea, que ao longo das últimas décadas foram objeto de um extenso trabalho de pesquisa e difusão tecnológica, conforme se segue:
. Sorgos – Os sorgos forrageiros ou aqueles que visam a maior produção de biomassa, usados em especial na produção de silagem têm utilizados de modo extensivo, a exemplo das cultivares IPA 73001011, IPA SF 15 e Ponta Negra. O primeiro desenvolvido pelas equipes do IPA, o segundo pelas equipes do IPA e da Secretaria de Agricultura de Alagoas e o terceiro em um esforço conjunto dos grupos de pesquisadores da Embrapa e da Emparn, do Rio Grande do Norte.

Milhetos – As cultivares de milheto pérola, da espécie Pennisetum americanum, são praticamente oriundas de um material liberado há cinquenta anos, o IPA-Bulk1. Material amplamente adaptado aos ecossistemas do Cerrado e, desde o primeiro momento parte fundamental na adoção do sistema de plantio direto. Ainda usado de forma intensa na área central do Brasil, mas necessitando de uma retomada de difusão quanto a vantagem da cultura como produtora de feno no semiárido.
. Capim Buffel – Desde os anos sessenta do século passado dezenas de cultivares foram introduzidos de diversos países, notadamente da África e da Ásia. Continua sendo os materiais preferidos para pastejo, embora hoje o mercado possa oferecer um amplo conjunto de opções de outros gêneros. Recentemente a Embrapa estabeleceu uma iniciativa de desenvolvimento de cultivares de capins próprios para o Semiárido, incluindo o capim buffel, o que tem contribuído para o crescimento da pecuária de corte em vários ambientes da região.
Gliricídia, pornunca, leucena, feijão guandu – Trata-se de um conjunto de opções direcionadas a melhoria da qualidade da alimentação animal devido a elevados teores de proteína, que complementam o cardápio de oferta além dos cactos e das gramíneas.
Portanto não é por falta de opções que cada estado ou município deixará de instituir ou manter seus programas de extensão rural e assistência técnica visando atender o produtor do semiárido.

Um trabalho de longo prazo com as espécies nativas
Esta questão foi levantada em textos anteriores. A descontinuidade das ações de pesquisa é o principal fator limitante da baixa capacidade efetiva de identificação de espécies forrageiras nativas adaptadas ao Semiárido. Esta é uma das áreas que requererá do MCTI, das Secretarias estaduais de ciência, tecnologia e inovação e dos bancos que operam o crédito rural no Nordeste, apoiar de modo incondicional. A maior parte das cultivares forrageiras em uso na região não foram introduzidas ou desenvolvidas pelos programas de pesquisa regionais, mas que se reconheça, introduzidas e que têm contribuído com a pecuária regional.
Já no que se refere às espécies nativas, a situação é bem mais crítica. Pela importância do bioma Caatinga, a riqueza de sua biodiversidade e, atualmente, o número de grupos de pesquisa na área de forragem disponíveis nas instituições científicas regionais, o tema deverá ser tratado como estratégico e objeto de financiamento contínuo para as propostas relevantes do ponto de vista científico e de aplicabilidade demonstrada.

A seca não pode sair de nosso radar
O que se tem tentado demonstrar é que sendo a seca um fenômeno de caráter permanente, a região semiárida deve ser objeto de iniciativas científicas contínuas, enfatizando a cooperação interinstitucional e o fortalecimento da parceria com universidades e instituições de pesquisa do exterior.

Um fato positivo divulgado esta semana foi a aquisição e instalação pela Cedan, uma empresa de alimentação animal, do empresário João Daniel, localizada em Serra Talhada, de um espectroscópio NIR, do inglês ´near infrared`, um instrumento capaz de analisar centenas de amostras ao dia e medir a composição centesimal de uma extensa gama de moléculas ou compostos químicos. Além de otimizar sua política de controle de qualidade e de rastreamento da origem da matéria prima, a Cedan passa a ser uma indústria que pode compartilhar esses serviços de forma comercial com outras empresas regionais e estabelecer parcerias com vários programas e pesquisa científica da região. Parabéns, Cedan, pela iniciativa. Um passo extremamente positivo no fortalecimento no uso do conhecimento e da ciência nas atividades empresariais do semiárido brasileiro.