Por Francis Lacerda
Climatologista do IPA
Os atuais reflexos ambientais, sociais, econômicos e políticos advindos das mudanças climáticas já são os maiores enfrentados pela humanidade. As alterações do clima no planeta, decorrentes do aumento de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera, onde se destaca o gás carbônico, representam desafios, principalmente, pela forma, abrangência e velocidade que estão acontecendo e suas consequências para a vida no planeta. Estima-se que as atividades humanas tenham provocado um aumento médio na temperatura global de 1,0°C, acima dos níveis pré-industriais, com uma variação provável de 0,8°C a 1,2°C. É provável que o aquecimento global atinja 1,5°C entre 2030 e 2052, caso continue a aumentar no ritmo atual, de acordo com informações do relatório do IPCC, divulgado em 09/13/2021.
Projeta-se, também, o aumento dos riscos relacionados a problemas com a saúde, meios de subsistência, segurança alimentar, abastecimento de água, segurança humana e crescimento econômico. As últimas quatro décadas foram sucessivamente mais quentes do que qualquer década anterior desde 1850, data usada como referência, que marca o início da revolução industrial, quando a queima de combustíveis fósseis, passou a ser intensa, aumentando a concentração de GEE na atmosfera.
As séries históricas têm evidenciado que os extremos diários de temperatura na terra estão aumentando, desde 1950 e, desde então, é possível notar que o sistema climático, de um modo geral, vem acumulando anomalamente mais energia, acarretando aumento nas temperaturas do ar, alterações na composição química da atmosfera, desencadeando uma série de transformações que incluem mudança no padrão de precipitações, alterações do ciclo hidrológico, produzindo enchentes intensas, secas severas e frequentes ondas de calor e frio com impactos significativos e consequências na segurança alimentar, na saúde e na segurança hídrica.
As previsões do IPCC indicam que o Brasil poderá ficar 3º C a 4º C mais quente até meados deste século e as precipitações, no Nordeste do Brasil, podem diminuir em até 40%. O Semiárido do Nordeste brasileiro deve experimentar os maiores aumentos de temperatura, em média 1,5 a 2 vezes mais que a taxa global de aquecimento. O número de dias por ano em que a temperatura na região pode exceder 35ºC pode ser de mais de 150 dias até o final do século. Estudos revelam que no Sertão do Araripe, em Pernambuco, já houve um aumento superior a 4º C na temperatura do ar em 48 anos e diminuição de 57% nos totais anuais de chuva. Essa diminuição anual das chuvas esteve acompanhada do aumento dos períodos máximos de estiagem que passaram de 20 para 35 dias e do aumento da frequência de eventos de precipitação intensa que passou de cinco para nove ocorrências por ano.
Sob essa ótica, as análises das variações de chuva e de temperatura, bem como seus impactos no balanço hídrico, são importantes para detecção dos efeitos do aquecimento global, mudanças climáticas locais e seus consequentes impactos. Outro impacto previsível é o acréscimo da evaporação e da evapotranspiração decorrente do aumento da temperatura que tende a ser especialmente danoso porque atinge todas as culturas agrícolas de sequeiro, as bacias hidrográficas e a disponibilidade hídrica do solo. Em destaque, as consequências relacionadas aos processos de desertificação causados pelo desmatamento, manejo inadequado dos recursos naturais nas áreas subúmidas, secas e semiáridas onde há comprometimento dos sistemas dos ecossistemas e dos sistemas produtivos, dos serviços ambientais e da conservação da biodiversidade.
Essas áreas se espalham por mais de 1.480 municípios no Nordeste e esse processo agrava-se com a mudança do clima que está intimamente relacionada à exploração em excesso de produtos florestais, às queimadas, à sobrecarga animal, ao uso intensivo do solo por manejo inadequado e, por último, ao emprego de tecnologias não apropriadas.
Considerando as variações climáticas no Nordeste do Brasil, diante dos cenários de mudança do clima atual e futuro coloca-se que as áreas mais afetadas pelas variações climáticas no Nordeste do Brasil serão Oeste do Piauí, Sul do Ceará, Norte da Bahia e Oeste de Pernambuco, onde se encontram municípios com reduzido índice de Desenvolvimento Humano – IDH.
A tendência de desertificação pode superar 90% do território semiárido de Pernambuco e as inundações decorrentes do aumento do nível do mar podem afetar grande parte do Litoral. Estudos de impactos das mudanças climáticas na estabilidade dos biomas brasileiros revelam que o bioma Caatinga está entre os mais vulneráveis num cenário de aumento das temperaturas globais, o que coloca a região Nordeste em alerta, uma vez que os efeitos das mudanças climáticas representam mais um fator diante da pressão de origem antrópica à desertificação.
Fonte: Núcleo de Comunicação