O comércio de gado no semiárido brasileiro tem como base as feiras de animais. Não são poucos os municípios que contam com pátios que dispõem de organização e estrutura capazes de permitir um comércio semanal de animais para cria, recria e abate, em particular no caso de bovinos e, em algumas cidades e vilas também para caprinos e ovinos.
Trata-se de um modelo centenário de comercialização, desde quando se deram as entradas Sertão adentro por pecuaristas da Bahia e de Pernambuco nos séculos XVII e XVIII. Modelo esse acentuado pelo transporte de mercadorias, bens e pessoas por tropas que rendilhavam todo o Agreste e Sertão até metade do século passado.
Algumas regiões mais férteis e com melhor distribuição de chuvas se tornaram polos de pecuária de leite e nos locais mais áridos e secos, a pecuária de corte. Caprinos e ovinos também foram incorporados a este sistema de produção animal, de modo mais relevante em áreas bem definidas do Sertão de Pernambuco.
A produção de carne bovina é impulsionada
Uma vez que as metrópoles e principais cidades da região são abastecidas por carne bovina proveniente de outros estados, a pecuária de corte, não dispensava uma melhor atenção por parte das instituições e até dos fornecedores de crédito, normalmente bancos oficiais.
Desde quando uma grande quantidade de imóveis rurais, antes utilizados para o plantio da cana-de-açúcar, depois pela pecuária de leite, foi desativada, iniciou-se a expansão da pecuária de corte, primeiro na Zona da Mata, seguindo-se do Agreste para o Sertão. Mas sempre com produção menor do que a demanda regional.
Nos últimos cinco anos já se notava uma maior valorização dos produtos cárneos e uma busca por animais de corte em substituição a planteis leiteiros, no interior de Pernambuco, culminando com um aumento expressivo dos preços no período de pandemia mudando fortemente o perfil da produção e do produtor em todo o Brasil.
Abatedouros em Pernambuco
Com o anúncio da construção de um abatedouro em Cachoeirinha, no Agreste, com uma capacidade de abate de 650 animais dia, uma corrida à melhor qualificação do gado de corte foi posta em curso, implicando na valorização até mais do que esperada de animais da raça Nelore.
Nesta última semana, um abatedouro de empresários locais foi inaugurado em Serra Talhada com a capacidade de receber 130 bovinos por dia, ou o equivalente a 40 mil animais ano. O que é um número expressivo para uma pecuária que tem se caracterizado como uma atividade secundária.
Faltam laticínios
Já no caso do leite a situação é um pouco mais complexa. Um abatedouro de porte médio não se estabeleceu em Serra Talhada, comprometendo uma bacia leiteira que estava sendo construída no Pajeú. Os laticínios atuais, como Betânia e Bom Leite estão distantes e não compensa transportar leite a uma distância de 250 km para ser processado. Uma vez que a teoria econômica é clara para o preenchimento de espaços vazios, há de se aguardar que em breve se possa contar com uma indústria de processamento de leite com capacidade de recepção entre 50 e 100 mil litros de leite que possa alavancar a pecuária de leite regional.
O mercado fazendo sua parte, o que se espera do governo
Dentre os gargalos apontados aparece em local de destaque uma maior dinâmica para a Agência de Defesa que apresenta deficiência de recursos humanos, e infraestrutura operacional limitando sua ação educativa seja no que se refere ao abate quanto à produção de produtos lácteos.
Fica claro também que diante dos desafios das mudanças climáticas em curso, um dos fatores mais relevantes ao sistema produtivo é o custo da alimentação. O preço do farelo de soja, do milho, bem como da silagem e do feno tornaram-se quase que proibitivos em alguns ambientes, fazendo com que o produtor tenha que procurar explorar ao máximo a capacidade de produção de alimentos e depender de fontes externos o mínimo possível. Logo fica clara a necessidade de investimentos em pesquisa e desenvolvimento destacando-se o desenvolvimento de novas cultivares de palma forrageira e capins de corte e pastejo capazes de tolerar estresses hídricos mais intensos e altas temperaturas.
No caso do melhoramento animal, em se tratando de bovinos, a predominância do genoma do Nelore é indiscutível. A cada ano, o percentual de produtores que opção por esta genética é maior, embora como em qualquer sistema de produção não se deva jogar todas as fichas em uma única opção. Havendo algum problema que possa afetar esta raça, toda a pecuária brasileira de carne estaria sendo sacrificada por longos anos à frente.
Em relação ao gado de leite, apesar dos avanços obtidos pelos programas de inseminação artificial e transferência de embriões, há um patrimônio genético, em Pernambuco, digno de reconhecimento. São os plantéis de gado Holandês, na Estação Experimental de São Bento do Una; Girolando, em Arcoverde e Guzerá, em Serra Talhada que merecem uma atenção especial.
Atualmente a genética nobre disponibilizada por esses plantéis não está sendo objeto de um programa sistematizado de inseminação artificial e muito menos de transferência de embrião, o que deve ser posto em prática urgentemente. Ainda persiste o comércio de tourinhos e novilhas em leilões periódicos, prática que deve ser estimulada e apoiada, uma vez que não são poucos os criadores do Agreste e Sertão de Pernambuco têm seus planteis formados a partir de aquisição nesses leilões.
Não é muito o que necessita ser feito, entretanto não se pode comprometer o que foi construído ao longo de décadas. Aí sim, é que não haveria retorno e tudo voltaria a estaca zero, o que não é do interesse de ninguém, particularmente dos pecuaristas do estado.
Fonte: Jornal do Sertão